Como Eu Vivi 22 Anos com um Impostor Dentro de Mim
Ele está dentro de você, escondido, te desviando de quem você é. Encontre-o antes que seja tarde demais.
Você sempre achou que sabia quem é. E se, na verdade, um impostor tivesse assumido o controle de sua vida de forma tão sutil que você nem percebeu, e acabou confundiu ele com quem você realmente é?
Eu estava refletindo esses dias, você já notou como as crianças referem a si mesmas em terceira pessoa? Como se elas tivessem uma consciência natural de quem são para além do nome.
Elas também transmitem uma energia natural, alegre e cheia de poder. As vezes, também consigo sentir essa energia em pessoas idosas. É como se fosse uma inocência, mas ao mesmo tempo uma inteligência de um nível superior, muito maior do que a que existe na mente.
Mas ai a vida vai se desenrolando, até que em algum momento essa essência criativa e alegre desaparece, dando lugar a um falso eu interior infeliz, frágil, limitado e amedrontado. O que aconteceu para dar origem a isso?
É simples, mas ao mesmo tempo muito profundo. Cada palavra escrita neste texto tem o objetivo de expandir a sua consciência e te recordar de sua essência.
O seguinte símbolo de ramo foi distribuído longo do texto como um indicador para você pausar por alguns instantes, relaxar e meditar sobre o que acabou de ler.
Me acompanhe nessa jornada de retorno para si mesmo.
A teoria da Cognição de Santiago
Em seus primeiros anos de existência, você era uma pura e alegre expressão criativa da vida. Isso acontece porque você ainda não havia caído na identificação com a mente.
Na década de 1970, os cientistas chilenos Humberto Maturana e Francisco Varela desenvolveram a teoria da Cognição de Santiago. De forma resumida, essa teoria propõe que o ser humano utiliza da mesma capacidade que possui de construir uma ferramenta para construir a identidade do seu eu interior com base no conhecimento que tem sobre si mesmo, que é acumulado ao longo da vida.
O grande problema é quando construímos a nossa identidade com base no conhecimento que temos sobre nós mesmos, passamos a nos identificar com nossas mentes, achamos que somos ela. Isso é uma grande disfunção, pois deixamos de ter a nossa essência natural como base de nosso sentido de eu interior — como as crianças —, e passamos a usar como base o nosso conteúdo mental, que é sempre o conhecimento do passado.
Basta dar uma olhadinha para aquela voz chata dentro de sua cabeça para perceber que o conhecimento que você tem sobre si não é nada bom. O meu por exemplo era: “eu sou incapaz”, “o mundo é cruel”, “eu nasci para sofrer”, “eu nasci para ser pobre”, “eu não sou merecedor” e coisas muito piores.
A identificação com esse conhecimento cria uma espécie de barreira que te impede de enxergar as coisas como elas realmente são, contaminando a sua visão do mundo e de si mesmo.
O ramo que se cortou da videira
Quando você se identifica com a mente, você se separa de quem é em essência e se reduz a um conjunto de ideias — um pequeno conceito fechado na mente. Nas palavras de Jesus, um “ramo cortado da videira”.
Um ramo cortado da videira está separado da grandiosidade de quem verdadeiramente é. Essa separação cria uma sensação de falta e de vazio interior, te fazendo se perceber como um pequeno fragmento abandonado e isolado em um universo hostil e ameaçador.
A separação da essência gera sofrimento e principalmente insatisfação com o momento presente, te fazendo buscar por preenchimento nas coisas externas — relacionamentos, sexo, bebidas, videogames, e redes sociais —, mas nada disso te preenche o suficiente ou de forma duradoura.
Este momento é tudo o que você tem
Você também busca a salvação dessa constante insatisfação se projetando compulsivamente em “futuro melhor”. Mas deixa eu te contar uma verdade dura: esse “futuro” ilusório nunca vai chegar. É somente um ponto em sua mente.
Tudo o que você tem é este eterno e único instante, a linha vertical onde toda a sua vida se desenvolve. Esse “futuro” que você tanto deseja não pode chegar de outra forma a não ser agora. E como você vive insatisfeito com o seu presente, adivinha só? Não vai estar presente o suficiente para criar agora o futuro que você deseja. É um ciclo interminável de insatisfação.
Nada de positivo pode surgir a partir de um estado negativo. Esse ciclo nunca vai acabar até você se reconectar com quem é em essência. O que você procura não está onde você procura.
Os Dois Senhores
Se identificou? Não se preocupe. A grande maioria vive nesse estado, identificadas com suas mentes e vivendo com um impostor dentro delas — como um instrumento que tomou posse do dono.
Dentro de você há você mesmo (a essência), e há a ideia que você criou a respeito de si (o falso eu). Como disse Jesus, “você não pode servir a dois senhores ao mesmo tempo”. Ou você é a mente finita e limitada, ou você é a consciência infinita e ilimitada acima da mente.
A construção do meu falso eu
Para a maioria das pessoas, a adolescência costuma ser uma fase “estranha”, e a minha foi bem assim. Hoje, eu consigo enxergar que essa foi a fase onde eu me identifiquei com a minha mente e comecei o mais fatal dos projetos: a construção do falso eu.
Eu era extremamente tímido. Tinha vergonha de pedir para ir ao banheiro na escola e até de levantar para levar a lição ao professor. Tinha baixa autoestima, dificuldade de aprendizado… Meus pais achavam até que eu tinha algum problema.
Todos esses fatos e circunstâncias que eu vivia iam criando camadas e mais camadas de ideias que eu tinha a respeito de quem eu era, reforçando a minha identificação com a mente e formando pouco a pouco um falso eu infeliz e limitado.
Logo, os falsos conceitos que me identifiquei e tomei como “meus” fizeram com que eu me percebesse como alguém burro, incapaz, feio, problemático e estranho.
Também sentia um vazio enorme dentro de mim, como se eu estivesse deslocado e perdido. Eu não entendia o sentido da vida, muito menos conseguia acreditar em Deus — na ideia de Deus que me foi descrita. Me sentia completamente deslocado dos demais.
Todos esses fatos fizeram com que eu me isolasse e passasse boa parte da adolescência inteira jogando videogame. Hoje, percebo o quanto deixei de viver naquele período. Tudo isso porque eu estava identificado com aquele conjunto de conceitos negativos e disfuncionais que havia formado sobre mim ao longo do tempo.
Isso me impedia de me expor, de fazer amizades e de viver quem eu realmente era em essência. Eu vivia insatisfeito com o momento atual, e essa insatisfação só gerava mais insatisfação.
Qualquer coisa tinha o poder de me abalar completamente. Um comentário, um olhar, uma expectativa não atendida. Eu era completamente dependente de fatores externos para obter, satisfação, aprovação e felicidade — e ninguém merece viver neste estado, sendo “arrastado” pelo mundo de lá pra cá.
O mundo tinha total poder e controle sobre mim, sobre a minha identidade, pensamentos e emoções. Com “mundo”, quero dizer pessoas, eventos e circunstâncias.
Como tudo no mundo é temporário e está em constante mudança, o que acontece quando nos apegamos às coisas externas e colocamos nosso sentido de identidade nelas? Exatamente. Essa é a fórmula do sofrimento. Nada do mundo foi feito para isso e nem pode preencher o vazio da nossa separação com a essência — relacionamentos, bens materiais, vícios. Nada disso.
Hoje, com 22 anos, percebo que passei todo esse tempo ignorando meu interior. Durante esse tempo, havia em mim uma essência esquecida — um universo silencioso que sempre ditou as regras do meu mundo. Eu estava totalmente deslocado e perdido no mundo — estava “longe de casa”, como Jesus disse na parábola do Filho Pródigo.
É muito triste pensar que grande parte das pessoas passam a vida inteira longe de casa, perdidas no mundo e no barulho mental, identificadas com todas as ideias absurdas que tomaram como “delas” ao longo do tempo, e que talvez nunca vão retomar a consciência de quem são em essência.
Arrisco dizer que a maioria das pessoas passará a vida toda sem nunca ter contato com esse tipo de conversa profunda que estamos tendo agora. Vão viver uma vida de sofrimento, sendo um falso eu — um conceito mental, um impostor dentro delas.
Mas se você está aqui comigo até agora, lendo e digerindo esse texto profundo e complexo, eu te digo: você não veio ao mundo para sofrer, e você é muito mais do que pensa que é. Está na hora de despertar.
Sejam como as crianças
O despertar é separar a consciência (sua essência) da mente (falso eu, tempo, pensamentos). Você não é a sua mente, está para além dela.
A mente foi criada por uma inteligência infinitamente maior do que ela mesma. Essa inteligência pertence a você como seu patrimônio natural, e se encontra por detrás do barulho mental — na quietude da consciência.
Lembra que eu mencionei que acho interessante o fato das crianças referirem a si mesmas em terceira pessoa, como se não se identificassem o nome?
O nome representa quem nós somos no mundo, nosso passado e nosso futuro. As crianças ainda não tiveram acúmulo de tempo o suficiente na mente para se identificarem com ele e construírem o falso eu.
“Digo a verdade: Quem não receber o Reino de Deus como uma criança, nunca entrará nele.”
— Jesus
Acho que você já está entendendo onde eu quero chegar.
Quem é você por debaixo do nome e por detrás da forma? Quem é você sem o tempo, sem um passado e sem um futuro? Essas perguntas são a chave para acessar o que você tem de mais precioso dentro de si — um estado de paz e de amor que excedem todo o entendimento.
No nível mais profundo do seu ser, você é um vasto campo de possibilidades infinitas.
Adentre no estado de presença
Na newsletter anterior, abordei que a chave do despertar é o estado de presença. Quando você está presente, cria um espaço de “mente vazia”, onde é possível sentir a sua essência mais profunda e silenciar a voz do falso eu.
Esses espaços de mente vazia podem ser curtos no início — logo a mente retorna com seu barulho —, mas quanto mais você escolher redirecionar a sua atenção do tempo para a presença, mais quieta e serena sua mente vai ficar. Perceber que não está presente já é presença.
Quanto mais eu pratico a presença, mais milagres eu vivo por meio deste estado de consciência. É como se tudo que eu fizesse fosse novo e prazeroso. A vida fica muito mais bonita, e a dopamina ganha um novo sentido — ser presente. A minha recompensa é simplesmente viver e estar presente para perceber e receber tudo o que a vida pode me proporcionar.
Você não veio ao mundo para sofrer
Ao contrário do que a maioria das pessoas pensam, nós não viemos ao mundo para sofrer. 99% do sofrimento psicológico é desnecessário.
Assim como os símbolos de ramo ao longo deste texto, o sofrimento funciona como uma espécie de alerta enviado por uma inteligência superior nos chamando para abandonar a mente a nos reconectar com a essência.
Em uma perspectiva superior, todo mal vem a serviço do nosso bem.
Eu quero que você viva o que eu vivo. Você não está perdido, como eu me sentia por muito tempo, apenas não se conectou com seu propósito interior — que é despertar para a consciência de quem você é além do tempo, do nome e da forma.
Perceba seus sentidos, aprenda a contemplar o tédio
A melhor forma que eu encontrei de exercitar a presença é entrar em um estado de “percepção dos sentidos”. Nesse estado, busque dar total atenção a qualquer atividade que você estiver fazendo, qualquer coisa mesmo.
Isso faz a qualidade das suas ações aumentar de forma extraordinária, porque elas não são mais apenas um meio para atingir um fim como antes, mas agora tem o fim em si mesmas.
Uma das minhas práticas favoritas é também a meditação. Meditar é simplesmente aprender a contemplar o tédio. Com o tempo, a meditação passa de uma prática para um estilo de vida — um estado de espírito e de consciência.
O que as pessoas costumam fazer quando estão entediadas? Pegam o celular e se distraem com grandes doses de dopamina. Isso mata o espaço onde a magia acontece, que é na quietude e na solitude do tédio.
O tédio precede a criatividade e abre as portas para o autoconhecimento.
Nesses momentos, busque apreciar e completamente a solitude. Sinta a sua própria presença — serena e silenciosa. Observe o ambiente, perceba o espaço, sinta os cheiros. Tome consciência da sua respiração, da temperatura do ambiente, do seu corpo em contato o chão. Está quente ou frio? Sinta o sangue percorrendo em suas veias. Sinta não só com a mente, mas com seu corpo inteiro — como uma só coisa. Escute os sons que estão presentes. O que você ouve? A natureza, animais, pessoas? Busque perceber o silencio por detrás dos sons.
Dê total atenção ao sentimento do tédio. Por quê você está entediado? Sente algum “impulso” dentro de você te apontando uma direção, te pedindo para fazer algo? Se tiver, anote, planeje ou faça. Se não, simplesmente aprecie a sua própria presença. Contemple o tédio. Essa é a porta de entrada para o que existe de mais profundo em você.
Como li em um dos meus livros favoritos, A Escola dos Deuses: “Auto-observação é cura.“
Observe a si mesmo — seus padrões de pensamento, sua mente, seu corpo. Perceba a presença silenciosa que os observa — essa é a sua consciência. Desperte para quem você verdadeiramente é. Abra espaço para algo novo surgir.
Você é como um lago profundo
Você não está perdido e abandonado e nem nunca esteve, só estava inconsciente, dormindo.
Perceba que, assim como um lago profundo, você não é só o movimento das ondas (a mente), mas também a quietude da profundeza (a consciência).
Hoje, talvez você se identifique como apenas uma pequena gota na superfície deste lago. A superfície é cheia de ondas e turbulências causadas por fatores externos, o que te faz ficar sendo arrastado de lá pra cá, com medo e dúvida do que está por vir. Você se sente como um pequeno fragmento perdido, isolado e separado do todo, largado em um mundo hostil e ameaçador, sem propósito e sem objetivo.
Mas agora você está desperto, sua consciência expandiu, e você sabe que não é apenas essa gotinha na superfície, mas o lago inteiro, em toda sua extensão e profundeza — lá onde tudo é sempre calmo e sereno e onde nada pode te abalar, te afetar nem te ferir.
Aprofunde-se cada vez mais para dentro de si mesmo, aqui e agora. Quanto mais você se aprofundar, mais vai perceber a vastidão dos tesouros que estavam ai dentro, mas nunca percebeu.
Vai notar que você nunca esteve sozinho, mas sempre em contato com algo muito maior — que é você mesmo, mas ao mesmo tempo muito maior do que você.
Debaixo de tudo e de todas as coisas, existe algo precioso que nós deveríamos possuir por direito. É o contato com esse algo que nos permitirá possuir tudo e todas as coisas.
“O Reino dos céus é como um tesouro escondido num campo. Certo homem, tendo-o encontrado, escondeu-o de novo e, então, cheio de alegria, foi, vendeu tudo o que tinha e comprou aquele campo.”
Você encontrou o impostor. Ele já não precisa mais estar aqui. A sua jornada está apenas começando. Você está pronto?
Meu nome é Diego, e essa é a minha contribuição.
Viva a sua verdade. Caminhe pela Porta Estreita.
SONHE MAIS.